“Rio 40 graus, cidade maravilha, purgatório da beleza e do caos”. O famoso verso de Fernanda Abreu nunca fez tanto sentido pra mim quanto essa semana. Parece que o término do horário de verão fez todos os cariocas acordarem mais cedo, o que só aumentou o trânsito já suficientemente caótico.
Sol na cara às 7h da matina, buzina de lá, freia de cá. Enquanto tento dormir, ouço os resmungos do marido ao volante: “Esse povo não sabe dirigir!”. Não sei se já disse aqui, mas eu odeio sol. Não há nenhum radicalismo nisso, eu simplesmente não me sinto bem com aquela luz toda, com o calor insuportável que não dá trégua nem à noite.
Ironia do destino, nasci em fevereiro, em pleno sábado de carnaval. Logo no mês mais quente do ano, foi vir ao mundo uma quase vampira (minha mãe sempre me chama assim, só porque gosto de manter a casa sempre no escurinho).
Para a grande maioria das pessoas, sol é sinônimo de energia, de ânimo, de alegria. Escrevendo assim, estou me sentindo uma ET, mas pra mim é justamente o oposto. Minha pressão abaixa, fico super indisposta. E olha que eu não suo quase nada! Nem preciso dizer do nojinho que tenho daquelas pizzas embaixo dos braços alheios, né?
Vou confessar outra peculiaridade minha: sabe aquele domingão de sol, quase meio-dia, em que 90% da população pensa em sair correndo para a praia? Pois é, em dias assim eu só penso em não tirar meu pezinho de casa e tenho arrepios ao pensar em praia. Até porque, em grandes cidades como o Rio, praia é sinônimo de trânsito.
Tudo isso pra dizer que hoje, ao chegar no trabalho com todas as sensações descritas acima, lembrei dessa poesia do Vinicius e imediatamente me transportei para um futuro não muito distante…
Poder dormir
Poder morar
Poder sair
Poder chegar
Poder viver
Bem devagar
E depois de partir poder voltar
E dizer: este aqui é o meu lugar
E poder assistir ao entardecer
E saber que vai ver o sol raiar
E ter amor e dar amor
E receber amor até não poder mais
E sem querer nenhum poder
Poder viver feliz pra se morrer em paz.